sábado, 30 de agosto de 2008

Caravana do OP, geografia e política.

O Conselho do Orçamento Participativo de Suzano, o CORPO, realizou a caravana das prioridades no sábado passado (23/8). Percorremos as 12 regiões em que a cidade foi organizada para a discussão do OP, totalizando 152 quilômetros. Nosso ônibus foi “conduzido” por conselheiros e conselheiras que, ao apresentarem os bairros, explicavam as características da região e discorriam sobre as prioridades eleitas em plenária. Em outras palavras, o povo indicando os caminhos.

Li recentemente ‘O que é ser geógrafo’, escrito por Cynara Menezes a partir das memórias e depoimentos de Aziz Nacib Ab’Saber. Premiado nacional e internacionalmente, Aziz dedicou parte de seus 80 anos de vida à compreensão das formações geomorfológicas do Brasil. Geógrafo se preocupa com as interações entre o homem (as sociedades) e a natureza. Para ele, “o geógrafo tem que estar sempre atento à história em processo (...). Na realidade, não existe planejamento regional sem estudos básicos de geografia humana e social”. A leitura confirma a necessidade da observação das paisagens e dos processos, cuja interpretação requer olhar crítico.

Esta foi a 3ª caravana do OP. Enquanto observávamos a paisagem urbana e a dinâmica social, em interação com o ambiente construído, percebíamos as mudanças em processo. Pela primeira vez na história desta cidade, é possível observar um centro cultural cravado no meio do Jardim Colorado, como resultado da discussão do povo no OP. Impressionante a felicidade de crianças e jovens durante as aulas de caricatura e dança e das mães observando a descoberta do mundo da arte; a ansiedade da comunidade acompanhando as obras da Unidade Básica de Saúde da Família em construção na Vila Fátima; a ampliação da Unidade de Saúde do Jardim Alterópolis, entre outras decisões do povo no OP.

Conselheiros e conselheiras compreenderam o que é responsabilidade com o investimento público, por afetar, inevitavelmente, a vida das pessoas. Na atual gestão é assim: investimento público é feito com responsabilidade, transparência, decisão coletiva e num processo pedagógico para que o povo se aproprie daquilo que é, de fato, seu. Isso é a expressão da democracia na cidade. É trabalho coletivo com o corpo em movimento de criação.

Não existe ser humano sem natureza, da mesma forma que inexiste ser humano sem política. São grandezas indissociáveis assim como a democracia e a participação popular. Governos autoritários escondem os dados do orçamento. O mesmo raciocínio serve para as eleições. Portanto, fica o alerta e o convite: vamos aproveitar o processo eleitoral para banir do cenário político os mentirosos e irresponsáveis. E por falar em natureza, é dos Titãs a música ‘nome aos bois’. Importante dar nome aos bois mesmo que isso provoque desconforto.

Publicado no jornal Diário de Suzano

sábado, 16 de agosto de 2008

Uma janela para a democracia

Nasci 37 anos atrás numa cidade do interior menor que Suzano em população. Lá existe um canal de televisão com programação local. Desde 1996, candidatos e candidatas a prefeito/a e vereador/a apresentam suas propostas em horário gratuito de TV e participam de debates ao vivo. Esta é a quarta eleição municipal consecutiva nesse padrão, o que amplia a democracia na cidade.

A Associação Comercial e Empresarial de Suzano promoveu debate entre os candidatos a prefeito com cobertura da mídia local. Valorizo a iniciativa, defendo sua ampliação, mas me incomoda o atraso. Ao discutirmos nesta coluna a participação popular como possibilidade de reinvenção da democracia, percebemos que os limites da democracia são socialmente construídos. Então, por que o Orçamento Participativo, os conselhos de escolas, de unidade de saúde e as conferências municipais não aconteceram antes?

Quem acompanhou o debate pôde conhecer melhor os projetos políticos e os interesses ali representados. Um deles representa o que há de arcaico na política, maquiado e travestido, tentando dizer para o eleitorado que fará tudo que não fez quando teve oportunidade, por falta de vontade política e por incompetência administrativa. O candidato, expressão pública do projeto, coloca os interesses do seu grupo acima dos interesses da população. Seu discurso é vazio. Fala de um suposto desenvolvimentismo desconectado da realidade da cidade e do mundo. Em pleno século XXI, usa descaradamente da falsidade por querer o poder a qualquer custo. Esconde sua trajetória política para se isentar das suas responsabilidades. Foi contra as Diretas Já! e agora fala em democracia. Expressão local do carlismo e do malufismo tratava o povo como meros pagadores de impostos, cidadãos e cidadãs de segunda categoria, incapazes de influenciar nos rumos de Suzano. Faz insinuações como se olhasse no espelho. Saiba, senhor: ninguém é a tua imagem refletida no espelho! Ainda bem. “Os espelhos permitem-nos ver objetos virtuais que existem no mundo virtual”.

O outro projeto político para Suzano é propositivo. Mostra realizações concretas no presente, planeja o futuro, compartilha possibilidades reais para o crescimento da cidade nas diversas áreas. E fala com paixão, com energia, com a segurança dos convictos. Rebate as agressões com a indignação de quem diferencia fatos de factóides. Perspicaz, observa os movimentos e identifica as aproximações ideológicas e as amarrações políticas entre os envolvidos na disputa. Quem investe na educação com uniforme e material escolar, constrói um moderno terminal de ônibus, melhora a iluminação pública da cidade inteira, asfalta bairros na periferia, oferece comida a R$ 1, garante título de moradia, valoriza o espaço público, implementa o orçamento participativo e amplia a democracia na cidade, persegue o interesse público.


Reli O espelho, de Guimarães Rosa.
Através da janela, o candidato à reeleição "pôde avistar todos seus vizinhos e amigos e a cidade inteira". Olha para o futuro e anda para a frente.





Artigo publicado no Jornal Diário de Suzano

sábado, 2 de agosto de 2008

Participação Popular em Suzano

A participação popular é a soberania do povo em ação, sua expressão concreta; é o efetivo exercício do poder político. Como costuma dizer o professor Juarez Braga, não há democracia sem participação popular.

Em 1948, os Estados-membros da Organização das Nações Unidas, ao proclamarem em assembléia geral a Declaração Universal dos Direitos Humanos, consignaram que “Todo o homem tem o direito de tomar parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos” (art. 21, item I).

No Brasil, a Constituição Federal assegura desde 1988 a participação popular na gestão das políticas públicas responsáveis pela implementação dos direitos sociais. Gestão democrática quadripartite da seguridade social, participação da população na formulação das políticas e no controle das ações de assistência social em todos os níveis e participação da comunidade como diretriz do Sistema Único de Saúde - SUS. Aliás, todo o regramento constitucional desse sistema foi desenvolvido a partir das conclusões da 8ª Conferência Nacional de Saúde Pública, realizada em 1986. Dentre as conclusões quanto à reformulação do Sistema Nacional de Saúde, ficou definido que este deveria “reger-se pelos princípios da participação da população na formulação da política, no planejamento, na gestão, na execução e na avaliação das ações de saúde”.

Hoje, conselheiros e conselheiras de unidade de saúde recebem o certificado de conclusão do processo de formação.

Até 2004 em Suzano, os poucos conselhos existentes foram criados em cumprimento à legislação federal. Em 2005, coincidiram duas forças: população disposta e em movimento e um governo aberto ao diálogo coletivo com foco no interesse público. Participação popular é eixo político na gestão Marcelo Candido. Os conselhos foram reformulados, canais de participação popular e diálogo foram criados: toda unidade escolar municipal conta com um conselho de escola; toda unidade de saúde conta com um Conselho Gestor. O ‘caçulinha’ é o Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência, tem ainda o Orçamento Participativo. Penso serem conquistas do povo de Suzano.


Meu amigo Juarez está coberto de razão: a ampliação da democracia passa, necessariamente, pela consolidação e pelo incremento da participação popular. Para o filósofo e historiador do pensamento político Norberto Bobbio, hoje o “indicador de desenvolvimento democrático não pode ser mais o número de pessoas que têm o direito de votar, mas o número de locais (...) nos quais se exerce o direto de voto”, “não mais o número de ‘quem’ vota, mas o do ‘onde’ vota”, tomando-se o voto como o ato típico e mais comum do participar, mas sem limitar a participação ao voto.



Publicado no Jornal Diário de Suzano